A Copa da Rússia salvará o Golpe Fuleco?

A Copa da Rússia salvará o Golpe Fuleco? Por Fábio de Oliveira Ribeiro Em outubro de 2017 esbocei uma teoria sobre a crise do discurso jurídico que se iniciou com o golpe de 2016. Nas últimas semanas essa crise se aprofundou e se revelou também como crise do discurso jornalístico. Inconformada com a derrota eleitoral e se apoiando na irresponsabilidade política de Aécio Neves, a imprensa brasileira conseguiu massificar o anti-petismo e amplificar manifestações de rua até construir um cenário em que a fraude jurídico-midiática-parlamentar do Impedimento se tornasse aceitável. Levar Michel Temer ao poder foi algo relativamente fácil. O resultado, porém, se apresenta como uma catástrofe política, econômica, fiscal e diplomática. Isolado no exterior e sitiado dentro do Brasil o governo não consegue mais planejar o futuro, nem administrar as contradições que criou. O golpe foi uma grande operação de propaganda. Por isso vale a pena lembrar as palavras do antropólogo sobre esse tema: “...a propaganda opera como uma espécie de tecnologia inversa ou ‘de trás para frente’: usa os pretendidos efeitos de um produto nas vidas das pessoas, e as reações humanas a esses efeitos, a fim de construir uma identidade significativa para o produto. É possível provar conclusivamente que qualquer tipo de pílula ou engenhoca ‘funciona melhor’ que outras, fazer com que ela ‘funcione melhor’, bastando apenas reajustar nossos padrões quanto a como ela deveria funcionar. E é assim que a própria propaganda funciona; ela redefine sutilmente que tipo de resultado as pessoas ‘desejam’ ao falar de seus produtos em termos desses desejos. Se ela consegue ‘vender’ esses desejos e a qualidade de vida que eles implicam, ‘vende’ também o produto que esses desejos e essa vida objetificam.” (A invenção da cultura, Roy Wagner, Cosac Naify, São Paulo, 2012 p. 162/163) Durante algum tempo a propaganda neoliberal disfarçada de jornalismo isento conseguiu difundir a crença de que a queda de Dilma Rousseff e as reformas de Michel Temer seriam capazes de produzir crescimento econômico. A economia continuou patinando, então os jornalistas tentaram usar a imagem da jovem primeira dama para esconder a incompetência do usurpador envelhecido. Mas o desemprego aumentou, a economia continuou a afundar e os índices de desenvolvimento humano declinaram. A imprensa se viu então diante de dois problemas gigantescos. O primeiro é a inexistência de um candidato viável. O segundo é a greve dos caminhoneiros. Como retratar o que estava ocorrendo? Os caminhoneiros haviam ajudado a derrubar Dilma Rousseff, mas foram abandonados à própria sorte . A dinâmica neoliberal imposta à Petrobras acarretou aumentos constantes do diesel num momento em que a renda das empresas de transportes continuava declinando em razão do fracasso econômico. A reação dos caminhoneiros assustou os golpistas e a imprensa foi obrigada a inventar uma explicação para a nova crise: Lula e Dilma eram culpados porque expandiram o crédito inundando as estradas de caminhões. Essa tese aloprada foi imediatamente desconstruída. Os ataques da imprensa aos caminhoneiros não surtiram efeito, tanto que a maioria da população apoiou a greve deles apesar dos inconvenientes que ela causou. O governo decidiu zerar o imposto do diesel e congelar o preço do produto por algum tempo. Essa medida paliativa não ataca a verdadeira causa do problema: a administração neoliberal da Petrobras. A redução de impostos não somente demonstra a fragilidade do governo (Michel Temer cedeu à pressão dos caminhoneiros) como acarretará uma maior deterioração fiscal (nenhum outro imposto será aumentado, garantiu o presidente da Câmara dos Deputados). A greve dos caminhoneiros começou a ser abandonada, mas os petroleiros resolveram cruzar os braços para forçar a demissão de Pedro Parente e a redução dos preços da gasolina e do gás de cozinha. A população brasileira tem muito mais razão para apoiar essa greve do que tinha para endossar a greve dos caminhoneiros. Portanto, o movimento dos petroleitos pode se tornar o embrião de uma campanha O petróleo é nosso 2.0. Os caminhoneiros ousaram desafiar o golpe “com o STF com tudo” e conseguiram o que desejavam, mas a conta terá que ser paga por todos os cidadãos brasileiros (a redução de impostos afetará a qualidade e a quantidade dos serviços públicos que podem ser prestados pelo Estado). Os petroleiros também desafiaram o poder dos juízes. A audácia deles, porém, somente trará benefícios ao Brasil e aos brasileiros que estão sendo obrigados a deixar os carros em casa ou a cozinhar usando fogões a lenha improvisados. No centro do golpe de 2016 estava a disputa pelo controle do petróleo no litoral brasileiro. A imprensa deslocou a atenção da população deste tema para dois outros (corrupção governamental e crise econômica) para destruir o governo Dilma Rousseff. A propaganda em favor do Impedimento fez a maioria da população acreditar que a vida seria melhor após o golpe disfarçado de impedimento. O produto político "vendido" pela imprensa e "desejado" pelos brasileiros em 2016 rapidamente estragou o que havia de bom no país. Tanto isso é verdade que até a CNI foi obrigada a pressionar o governo para resolver a crise dos caminhoneiros que já estava afetando de maneira negativa os interesses dos industriais. As pessoas sabem que a economia piorou, que o desemprego aumentou e que qualidade de suas próprias vidas está declinando. Isso explica tanto a preferência pela candidatura de Lula quanto a incapacidade evidente da imprensa de fabricar um consenso contra as greves dos caminhoneiros e dos petroleiros. Ao ver caminhoneiros em greve defendendo uma “intervenção militar” alguns analistas de esquerda ficaram assustados com o caldo de cultura fascista que aflorou nas ruas. Carmem Lúcia e o general Etchegoyen disseram recentemente que a saída para a crise será democrática. A fala deles pode ser interpretada como um recado para os aloprados nas ruas. É mais provável, porém, que os destinatários da mensagem de ambos sejam os donos dos meios de transmissão de informações. À deterioração do discurso jurídico (e da autoridade do Poder Judiciário), podemos acrescentar agora a fragilização maior do poder simbólico da imprensa brasileira de "vender" o neoliberalismo como um produto eleitoralmente viável. Não por acaso Lula quer ser o candidato anti-Rede Globo. Ele deve ter intuído que esse é o caminho mais fácil para retornar à presidência. Todavia, entre Lula e a presidência existe a cancela controlada pelos juízes. O poder de mantê-la fechada, porém, está ficando cada vez menor. O golpe “com o STF com tudo” desmorona porque já lhe falta o componente mais importante: “tudo”, ou seja, consenso entre os empresários, candidato eleitoralmente viável, autoridade do discurso jurídico e jornalístico, crescimento econômico, emprego, renda, consumo, direitos sociais e trabalhistas, combustíveis baratos, tranquilidade pública e, sobretudo, a capacidade da imprensa de se ajustar à realidade ao invés de ficar inutilmente tentando construí-la artificialmente. Daqui há alguns dias começará a Copa da Rússia. O governo, os barões da mídia e os juízes (ou seja, os sócios do golpe de 2016) devem estar aguardando ansiosamente este evento, pois ele desviará a atenção dos brasileiros. A Copa do Brasil foi utilizada para atacar ferozmente o governo petista. A da Rússia certamente será utilizada para tentar salvar o neoliberalismo de Pedro Parente. Quando o nome do mascote da Copa do Brasil foi escolhido publiquei um pequeno texto na internet: “FULECO = em inglês ‘Full Lac’ ou ‘Full Lack’ (nos dois casos a pronúncia é a mesma, ou seja, "Ful Lék" ). O significado destas duas expressões são bastante distintas. ‘Full Lac’ quer dizer ‘tudo envernizado’. ‘Full Lack’ significa ‘carência de tudo’. ‘Carência de tudo’ é uma maneira de se referir à pobreza do Brasil. Comparado à UE, nosso país é indigente tanto materialmente quanto administrativamente. ‘Tudo envernizado’ é uma maneira de sugerir que no Brasil até as coisas velhas e desgastadas recebem uma mão de verniz para ficarem parecendo novas. O próprio D. João VI não maquiou a cidade do Rio de Janeiro para ser entronizado Rei de Portugal? O nome FULECO pode ser considerado uma maneira sutil que os europeus da FIFA encontraram para humilhar o Brasil e os brasileiros. Mas os imbecis que votaram no nome provavelmente não perceberam disto. Portanto, já podemos rir deles.” https://midiaindependente.org/pt/blue/2012/11/514220.shtml O golpe “com o STF com tudo” ficou sem nada. Agora ele só tem a Copa da Rússia. Portanto, podemos dizer que é um Golpe Fuleco. jornalggn.com.br

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