70 anos da Consolidação das Leis do Trabalho

70 anos da Consolidação das Leis do Trabalho Bondade de Vargas ou conquista dos trabalhadores? Helenice Viana - Ascom/SECI I004841.JPG Naquele sábado o estádio São Januário (RJ) estava lotado por milhares de trabalhadores. Mas não foi só por uma partida de futebol. Era 1º de maio de 1943, Dia dos Trabalhadores. Cerca de 100 mil pessoas aguardavam o discurso do então presidente Getúlio Vargas sem saber quão significativas seriam as mudanças lançadas naquele dia. “O trabalhador brasileiro possui hoje o seu código de direitos, a sua carta de emancipação econômica”, destacava Vargas ao anunciar a Consolidação das Leis do Trabalho - CLT. Mas o que realmente representou a CLT para a classe trabalhadora? Por que Vargas decidiu promulgar essas leis? Como o movimento sindical analisa a CLT atualmente? Essas e outras questões foram pontuadas com a contribuição do historiador e jornalista Sávio Tarso, do sociólogo e educador Luiz Antônio e do advogado e sindicalista Marcos Túlio. Um acordo para amansar os trabalhadores A década de 30 foi de grande efervescência das lutas sociais brasileiras e internacionais. Explodiam em vários locais conflitos entre trabalhadores e as classes dominantes, motivados pela reivindicação de direitos trabalhistas, como a redução da jornada e melhores condições de trabalho. O Brasil recentemente havia abolido a escravidão (13/05/1888) e sua economia ainda era basicamente agrícola. Vargas queria industrializar o país, para isso precisava criar a figura do trabalhador urbano. Mas antes de formar a classe operária era necessário acabar com essa onda de manifestações coletivas. Vargas, então, se inspira na Carta Del Lavoro, do fascista italiano Mussolini, e no New Deal (Novo Trato) implementado por Roosevelt nos EUA, para criar a CLT. Seu objetivo era pacificar o confronto entre capitalistas e trabalhadores, por meio da cooperação entre essas classes. “Getúlio era um fazendeiro, um latifundiário, ele não queria grandes rupturas, mas queria desenvolver a indústria nacional. Esse foi um passo importante porque se não fosse a CLT o Brasil seria uma roça grande. Mas também se não fosse a pressão e organização dos trabalhadores, se os sindicatos não tivessem feito greve, o Brasil não teria a CLT. Vargas preferiu dar o dedo para não perder a mão”, conclui o historiador. Sindicatos submetidos ao governo Para controlar a classe trabalhadora, o enfrentamento entre patrões e empregados é substituído por uma versão de pacto. O trabalhador é convidado a ser um sócio do Brasil, colaborando e entrando em acordo com as empresas. Com o surgimento da CLT, ao invés de se unir a outros para reivindicar direitos coletivos, o trabalhador passou a entrar na Justiça, individualmente, quando desrespeitado. Além disso, Vargas vinculou todos os sindicatos à estrutura de poder do governo. Com essas medidas, ele esvaziou as grandes mobilizações coletivas, trouxe para o seu lado várias lideranças e reduziu a autonomia dos sindicatos. “Foi uma forma de controlar o movimento sindical. A CUT surgiu justamente com esse questionamento. Porque se tudo tinha que ser submetido ao Ministério do Trabalho, a liberdade sindical, conforme previa a Constituição Federal, não era plena”, destaca Marcos Túlio, que é também diretor da CUT Vale do Aço. Para o sociólogo Luiz Antônio, ao inventar essa estrutura corporativista (dividida em categorias/ setores) para o movimento sindical, Vargas prejudicou a organização dos trabalhadores, pois eles passaram a não se ver mais como parte de uma mesma classe. É preciso atualizar a legislação trabalhista Por mais que a CLT tenha trazido vários danos ao movimento sindical, os três formadores reconhecem que a sua criação representou avanços para a classe trabalhadora. É tanto que a partir dos governos neoliberais de Collor e Fernando Henrique Cardoso, o movimento sindical passou a defender essa legislação com unhas e dentes. “Dado o contexto de privatizações, terceirizações e demissões, com ataques frontais aos nossos direitos, tivemos que nos valer da CLT, que se mostrou um instrumento importante de proteção coletiva”, afirma Marcos Túlio. No entanto, ele pontua que é necessário haver uma atualização da legislação trabalhista. Isso não significa enxugar ou eliminar direitos, mas sim propor algo mais moderno que considere as novas modalidades de trabalho e que acabe com as tentativas patronais de burlar a legislação. O professor Luiz Antonio reforça essa opinião analisando o mundo do trabalho a partir do surgimento das novas tecnologias. “Ao contrário do que era previsto, a tecnologia não fez diminuir as jornadas, pelo contrário, a maior parte do tempo das pessoas é dedicada ao trabalho. Então, alguns aspectos da CLT precisam ser reatualizados, criando um novo estatuto do trabalho, que inclusive supere a visão corporativista da estrutura sindical”. 1º de maio: dia de luta ou de festa? Vargas era considerado por muitos como o pai dos pobres e mãe dos ricos. Os três estudiosos citaram essa ambiguidade presente na figura de Vargas para explicar que a CLT não foi criada meramente por uma bondade desse presidente. Essa legislação foi um misto de concessão e conquista, já que foi resultado da pressão exercida pelas forças sociais, tanto a efervescência do movimento dos trabalhadores como a necessidade de industrializar o país e pacificar os confrontos trabalhistas. Mesmo depois de 70 anos, é essencial para os trabalhadores entender o que pode provocar mudanças no mundo do trabalho. Ainda mais com a aproximação do 1º de maio. Ao promulgar a CLT no Dia dos Trabalhadores, Vargas não fez por acaso. Ele tinha consciência da organização do movimento e queria converter o dia de luta e reivindicação em um dia de comemoração e festa. Um modelo que atualmente é reforçado quando, nesse dia, alguns sindicatos ao invés de reivindicar mudanças, simplesmente promovem shows e sorteios de prêmios. Nesse sentido, a marca do Dia dos Trabalhadores, como uma data de luta deve ser resgatada, pois a História prova que os trabalhadores organizados podem e devem conquistar muitos outros avanços. Fonte : Assessoria de Comunicação / SECI

Comentários