Clara para sempre

Clara para sempre Às vezes me pergunto por que tanto me identifiquei com Clara Nunes. Por ser mineira? Claro que já bastaria para muitos de nós mineiros nos identificarmos à grande cantora. Pela sua forte religiosidade, impregnada dos misticismos da mãe África, ou do catolicismo de raiz, ou o espiritismo que em alguns momentos nos entontece? Sem dúvida é a síntese do sincretismo que paira sobre as Minas Gerais, é a condensação de crenças, oferendas, perfumes, fé, esperança. Ou será que sempre cantou a voz do povo, suas singelezas e sofrimentos. Ela nos alimentou de esperança e fé, de amor e carinho, de sonho e paixão, de utopia e luta. Clara está em cada um de nós que sonha com algo melhor para todo mundo. Levou uma vida muito simples lá na região de Cedro, cujo nome se confunde com a indústria têxtil e depois de perder os pais, foi criada com seus irmãos mais velhos. Conviveu com tragédias familiares e ainda mocinha, foi morar com uma tia em BH para trabalhar ainda no ramo têxtil. Em Belo Horizonte conseguiu um grande sucesso, mas era um espaço limitado para crescer. Batalhou muito no Rio de Janeiro, gravando canções que no início não deslancharam, mas conseguiu chegar até uma unanimidade quando se tratava do samba. Seu engajamento pela valorização do samba de raiz, pelo reconhecimento dos compositores esquecidos, pela luta dos trabalhadores contra a ditadura, pela libertação de Angola, nos festivais de música, enfim, Clara, foi uma mulher de seu tempo, de um tempo difícil, mas de muita solidariedade entre seus colegas. Por ser uma pessoa generosa, teve poucos inimigos. A legião de fãs era enorme e com muitos admiradores pelo mundo afora. Pena que ela se foi tão cedo, com seus 41 anos de idade. Uma simples cirurgia de variz e perderíamos a grande Clara. Quando escuto o “Canto das Três Raças”, “Lama”, “Basta um Dia”, “Feira de Mangaio” e tantos outros sucessos, não penso nas contundentes letras que ela interpretou, mas na emoção rasgada e escancarada que ela transmitia. Sempre me emociono quando ouço alguns de seus hits. Aliás, Paulinho Pinheiro é um dos grandes mestres da música e a paixão vivida com Clara marcou a cena cultural dos anos 70 e início dos anos 80 no Brasil. 02 de abril de 1983. O Brasil parou para dar seu último adeus a uma rainha. O seu canto emocionou multidões, a sua morte emocionou a todos nós. Eu tinha apenas 11 anos, mas me surpreendi com a notícia na televisão. Claro que já a conhecia, mesmo que vagamente, gostava de sua voz. Depois, ficou para sempre marcada em minha lembrança. “Vou-me embora, vou-me embora/ Eu aqui volto mais não/Vou morar no infinito/E virar constelação” de Norival Reis e David Correa para o Enredo “Macunaíma, herói de nossa gente” da Portela em 1975. (Fonte: Clara Nunes: Guerreira da Utopia de Vagner Fernandes) Marcos Túlio

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