CONTRIBUICÃO AO DEBATE SOBRE REFORMA ESTATUTÁRIA

CONTRIBUICÃO AO DEBATE SOBRE REFORMA ESTATUTÁRIA

Marcos Túlio Silva

O 10º Congresso Nacional da CUT apontou para a necessidade de uma reformulação do nosso estatuto, levando em conta a mudança de conjuntura e a necessidade de atualização de nossas ações e apontou que a Direção Nacional propusesse um texto-base para a reflexão nas plenárias estatutárias. Avaliando o texto da Nacional, percebi importantes contribuições para o debate da reforma estatutária.
Em alguns momentos do Eixo 2 do Caderno de Texto-Base da Direção, percebo que são propostas de atuação para as entidades e direções cutistas e em outros momentos, propostas de alteração no estatuto da Central e nos estatutos das entidades filiadas. O Eixo 2 ressalta a importância de lutarmos pela ratificação da Convenção 87 da OIT que prevê a liberdade e autonomia sindicais, elementos chave no processo de construção da CUT. Na prática, o que vemos, são categorias cada vez mais fracionadas, criação exagerada de sindicatos sem representatividade alguma, luta ferrenha pelo imposto sindical, disputa acirrada nas eleições sindicais. A portaria 186 do Ministério do Trabalho acabou facilitando a pluralidade sindical nas representações superiores dos ramos, federações e confederações, mas manteve a unicidade nas instâncias de base, os sindicatos. O fato é que no Brasil são criados 2 sindicatos por dia e mesmo a CUT não fez muito esforço para conter essa onda ou fábrica de sindicatos.
É importante que tomemos uma medida drástica em relação à forma como o Ministério do Trabalho atua na facilitação de liberação das cartas sindicais para as entidades ligadas à Força Sindical e a dificuldade que impõe às entidades cutistas. Na pratica, no Brasil, não há qualquer liberdade sindical, pois, todo o processo de registro, cadastro, está em poder do Governo Federal. Outra dificuldade grande que devemos agir com rapidez e rigor no combate é a chamada judicialização da ação sindical. Não dá para aceitar mais a interferência direta e às vezes descabida do Judiciário nas negociações coletivas, em assembleias das trabalhadoras e trabalhadores, nas eleições sindicais e, principalmente, nas greves das categorias. Há casos de julgamentos do direito de greve no serviço publico, por exemplo, que a multa imposta à entidade é infinitamente superior a sua receita. Sem falar nos interditos proibitórios concedidos sem controle algum, impondo ao dirigente sindical a proibição de fazer o contato com o trabalhador e a trabalhadora em seu local de trabalho.
Portanto, conforme o texto-base da CUT Nacional, desafios de se criar um Sistema Democrático das Relações de Trabalho, passa por buscar incansavelmente, a nossa liberdade sindical, onde os próprios trabalhadores e trabalhadoras definam qual a melhor forma de organização. Também sem construção de uma cultura em nosso meio de que a Organização por Local de Trabalho é essencial para a construção permanente da democracia na Central e da renovação constante de nossas direções. É importante que se defina com clareza sobre a importância de fortalecimento dos ramos e da construção cotidiana de confederações e federações cada vez mais defensoras do projeto cutista. As Estaduais, bem como suas Regionais, não podem ser meros escritórios da CUT Nacional que apenas reproduzem uma política sindical sem levar em conta suas próprias autonomias.
Em relação às eleições sindicais eu concordo com o texto, pois, não dá para aceitar mais, eleições que não sejam democráticas, que não garantam o acesso às diferenças de pensamento, às minorias, onde as mulheres continuam a ocupar cargos secundários das direções. As disputas internas em suas maiorias, não são por diferença de concepção ou diferença de projeto, mas numa disputa interna onde o pessoal prevaleça sobre o político, ou alguns dirigentes querem apenas disputar os aparelhos sindicais e tem acontecido muito, a influência dos gabinetes nas políticas sindicais.
Aliado a tudo isso, ainda temos um quadro de deficiência de formação e a renovação em algumas categorias fica praticamente impossível. Em caso de disputa entre correntes cutistas o que se vê em alguns casos é a aliança com outras centrais sindicais, favorecendo o divisionismo e oportunismo das “co-irmãs”. A propósito, um comentário a parte, acho que deveríamos rever a nossa política de aliança com as outras centrais, haja vista, que quando colocamos pontos fundamentais para nós como o fim do imposto sindical, as outras se debelam, desconstruindo assim, qualquer possibilidade de aliança estratégica. Por fim, em caso de disputa com chapas de cutistas, devemos regulamentar o mais rápido possível, a convenção cutista. Outra coisa importante para avançarmos em relação às eleições sindicais é a constituição de um comitê regional para organização.
Para o tema da liberdade sindical, é importante que se crie mecanismos de se garantir que uma entidade seja realmente representativa, como número de filiados na base, periodicidade de reuniões, assembleias com trabalhadores e trabalhadoras, etc. Mas para garantir uma liberdade sindical plena, é necessário que os trabalhadores não se sujeitem a um controle estatal da atividade sindical, bem como se coíba a prática anti-sindical, tão espalhada pelo Brasil e que provoca uma terrível intimidação ao movimento sindical. Também é essencial lutarmos pela democratização do poder judiciário, para que a sociedade possa participar mais de suas decisões e também se elimine o poder normativo da justiça do trabalho. É necessário, pois, a revogação do art. 522 da CLT que impõe limites à estabilidade do dirigente sindical.
Antes de entrar no tema da reforma estatutária, é preciso ainda debater sobre a sustentação financeira da Central. Hoje há um grande número de entidades inadimplentes, pelo menos em Minas Gerais e a Central não pode depender do dinheiro do imposto sindical, que, aliás, a Conferência Nacional de Finanças determinou que a receita do imposto sindical fosse repassada para as Estaduais e ramos, após aprovado o Plano de Ação Sindical. Mas o que acontece na prática, é que as Estaduais têm ficado com o pires na mão devido aos minguados repasses feitos pela Nacional e, consequentemente, as Regionais, que estão precarizadas em sua estrutura. Regionais, aliás, que eram reconhecidas há um tempo, depois saíram da estrutura oficial, no último congresso nacional foi aprovado um texto reafirmando a importância das mesmas, mas até hoje são desprezadas em relação à sustentação, tanto financeira quanto política.
Acredito que as Regionais, e as Estaduais também, deveriam receber um repasse mínimo que lhes garantissem um funcionamento básico, como aluguel, funcionário, telefone, internet, um boletim por mês e em troca, seria exigido a organização de seminários de formação, assessoria em negociação coletiva ou planejamento estratégico para as entidades, apoio nas eleições sindicais, entre outras. Não dá para aceitar o discurso de que as Regionais deveriam ser fechadas e virassem escritórios, se com o trabalho descentralizado já é difícil, imagine um escritório sem representação política. Portanto o debate do financiamento é importante, mas se não for sério, a CUT tende a ser uma central sindical de iluminados e sem presença de base.
Outro debate que é importante fazer, a forma de cobrança da mensalidade é muito injusta, pois, cobra-se do mesmo jeito, independentemente da realidade econômica da entidade. Não há progressividade na cobrança e o certo é que a entidade que tivesse mais sócio e mais receita pagaria mais e vice-versa, como é feito no Dieese atualmente. Então, é importante que a Central exija com firmeza o fim do imposto sindical e que se aprove a taxa negocial aprovada em assembléia, além de realizar uma campanha para as entidades filiadas para que as mesmas promovam a racionalização na gestão sindical e que se reduza o número de taxas e contribuições cobrados dos trabalhadores e trabalhadoras filiados e filiadas nos sindicatos.
Por fim, em relação às alterações estatutárias das entidades sindicais, o que o Eixo 2 propõe, concordo em boa parte, tais como: inclusão nos estatutos sindicais das diretrizes e princípios cutistas, mandato de 4 anos (nesse caso a CUT propõe uma readequação até o 12º CONCUT em 2015), incluir a representação dos terceirizados, aprovação das contas do sindicato em assembléia, que as OLTs se tornem instância de decisão, garantia de 30% de mulheres em todos os espaços cutistas, como seminários, congressos, plenárias, etc, eleição dos delegados e delegadas em assembleias ou instancias de base. Além dessas alterações, proponho que tanto para as direções da CUT como para os sindicatos filiados, que haja uma limitação do mandato em apenas dois mandatos, que o dirigente cutista comprova a sua real relação de trabalho, antes de ser liberado para a central ou entidade e por fim, a eleição direta para presidente da CUT, onde os trabalhadores e trabalhadoras possam participar e não mais pelo sistema de delegação. Acredito também que os estatutos poderiam trazer perfis mínimos para ser um dirigente da maior central da América Latina, seja da própria CUT, seja de uma entidade filiada.
Os sindicatos e a própria Central, não podem ser instancias autoritárias, mas verdadeiros espaços de exercício democrático. Onde se prevaleça sempre a vontade do trabalhador e da trabalhadora, onde os mesmo se sintam donos das entidades que ajudam a construir ao longo da história.
As plenárias estatutárias servirão para um amplo debate sobre a CUT do agora e como será do amanhã. É importante voltarmos os nossos olhos para determinadas categorias de trabalhadores e trabalhadoras que estão fora do processo formal de organização sindical, como os trabalhadores informais. Outros atores que normalmente são esquecidos como a juventude, os negros e negras, a população GLBTT, aposentados entre tantos outros, deveriam ser mais ouvidos. As novas secretarias da CUT vieram para ficar, mas precisam ter uma maior importância no dia-a-dia da Central e, quem sabe, o 11º Concut do ano que vem, possa servir para pensarmos a CUT para os próximos 25 anos.

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