Eduardo Galeano, a cultura do terror e a desinformação dos produtores de armas

12/03/2011
Em entrevista exclusiva à Telesul, escritor uruguaio condena manipulação da mídia
Escrito por: Leonardo Severo



Em entrevista exclusiva à Telesul, emissora que conseguiu romper o cerco midiático à Líbia, o escritor uruguaio Eduardo Galeano disse que não via convincente o “apelo à paz” no país árabe, feito recentemente por países membros permanentes do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU), pois “esses países, que governam o mundo, não são somente partícipes de guerras, senão os maiores e principais produtores de armas”.

Passados alguns dias da entrevista, vários governos destes países querem uma “zona de exclusão aérea”, similar a que fizeram no Iraque, para preparar o depois na também potência petrolífera. E tomar de assalto as riquezas.

O autor do clássico livro As veias abertas da América Latina alertou que “Para sermos de verdade independentes, temos de ser capazes de caminhar com nossas pernas, pensar com nossas próprias cabeças e sentir como nossos próprios corações”.

Em dias de intenso bombardeio midiático, em que muitos sucumbem ao vírus da desinformação repetindo argumentos dos meios privados de comunicação, vale a pena rememorar, com Eduardo Galeano, “A cultura do terror/6”, do seu “O livro dos abraços”. E questionar – e muito – o que nos chega pelo filtro das agências de notícias sobre o que está realmente acontecendo no mundo. Árabe ou não.

A cultura do terror/6

Pedro Algorta, advogado, mostrou-me o gordo expediente do assassinato de duas mulheres. O crime duplo tinha sido à faca, no final de 1982, num subúrbio de Montevidéu.

A acusada, Alma Di Agosto, tinha confessado. Estava presa fazia mais de um ano; e parecia condenada a apodrecer no cárcere o resto da vida.

Seguindo o costume, os policiais tinham violado e torturado a mulher. Depois de um mês de contínuas surras, tinham arrancado de Alma várias confissões. As confissões não eram muito parecidas entre si, como se ela tivesse cometido o mesmo assassinato de maneiras muito diferentes. Em cada confissão havia personagens diferentes, pitorescos fantasmas sem nome ou domicílio, porque a máquina de dar choques converte qualquer um em fecundo romancista; e em todos os casos a autora demonstrava ter a agilidade de uma atleta olímpica, os músculos de uma forçuda de parque de diversões e a destreza de uma matadora profissional. Mas o que mais surpreendia era a riqueza de detalhes: em cada confissão, a acusada descrevia com precisão milimétrica roupas, gestos, cenários, situações, objetos...

Alma Di Agosto era cega.

Seus vizinhos, que a conheciam e gostavam dela, estavam convencidos de que ela era culpada.

- Por quê? – Perguntou o advogado.

- Porque os jornais dizem.

- Mas os jornais mentem – disse o advogado.

- Mas o rádio também diz – explicaram os vizinhos. – E até a televisão!

(Extraído do site da CUT)

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