Minhas duas eleições

Minhas duas eleições

Maria Luisa Cavalcanti
Como cidadã com dupla nacionalidade, estou me vendo neste ano em uma situação peculiar: votar em duas grandes eleições para escolher os líderes dos meus países.

Coincidentemente, esses dois países vão às urnas para decidir se dão continuidade aos muitos anos de mandatos da esquerda ou se preferem ver mudanças no poder.

Também nos dois, a corrida eleitoral já começou há tempos, com os pré-candidatos fazendo suas campanhas, os institutos de pesquisa oferecendo simulações dos resultados, os analistas políticos traçando este ou aquele cenário.

Mas as semelhanças param por aqui.

No Brasil, por mais desanimada que seja uma campanha, não há como fugir dela: temos propaganda eleitoral gratuita, cartazes e pixações, conversas na padaria e na fila do ônibus, gente fazendo boca-de-urna, carreatas. De alguma maneira ou de outra, você vai acabar falando de política.

Aqui na Grã-Bretanha não tem nada disso. Uma pessoa não muito interessada em política pode passar à margem do assunto e ir tocando a vida.

Para o eleitor britânico, o sinal da proximidade de uma votação é uma carta que o registro eleitoral manda para confirmar que naquele endereço há x pessoas habilitadas a votar. Eles aproveitam e perguntam também se você quer votar por correio.

Agora, com as eleições parlamentares previstas para maio, tenho recebido folhetos e mais folhetos dos candidatos da minha "constituency" (ou distrito eleitoral, que no meu caso engloba dois bairros do norte de Londres). Eles dizem o que conseguiram fazer pela comunidade local nos últimos anos e o que querem fazer se forem eleitos. O candidato conservador do meu bairro aproveitou também para dizer que ele é o único capaz de derrotar a atual MP trabalhista.

Os possíveis novos primeiros-ministros, o atual Gordon Brown e o rival David Cameron, dão entrevistas a vários órgãos de imprensa, rodam o país para fazer o "corpo a corpo" com o eleitorado, dão opinião sobre tudo. Pela primeira vez na história, farão um debate frente a frente. Mas o clima de "já ganhou" dos conservadores esvazia a eleição britânica de emoções.

O voto aqui não é obrigatório e eu, que saí do Brasil há tantos anos, poderia fazer como várias pessoas que conheço e simplesmente justificar minha ausência.

Mas como filha de pais que só votaram pela primeira vez aos 45 anos, estou contente de poder votar em dose dupla.

O chato daqui vai ser mandar minha escolha pelo correio, sem aquela emoção de ir até a seção eleitoral e digitar o voto na urna, dar uma olhada no movimento, ouvir o que as pessoas estão dizendo.

Ainda bem que no fim do ano, tenho meu dia de ir à embaixada brasileira. A fila em 2006 foi bem maior que em 2002, e este ano acho que vai estar ainda maior. Mas tudo bem, compenso nas barracas de pastel montadas por ali.

(Extraído do BBC Brasil)

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